Preparar o pão |
Almoço Pku |
Sou o João Pku e hoje é terça feira de Carnaval |
Sou o João, tenho 8 anos e sou PKU. A condição de ser fenilcetonúrico, Pku, não me impede de ser um dos melhores alunos da minha turma do 3º ano. Não me impede de aprender a nadar na piscina com a turma, nem de almoçar com toda a escola no refeitório. Sou o único que levo lancheira de casa. Sim, e então? Qual é o problema? A minha mãe faz os meus pratos preferidos ( e os outros também), e ao fim de algum tempo, no refeitório já ninguém estranha as minhas sopas de beterraba cor de rosa shocking e as minhas panquecas apetitosas, o meu arroz de letras amarelo e as mil e uma maneiras de cozinhar cogumelos. Às vezes até invejam um bocadinho as minhas frutas super coloridas e diferentes de todas as outras. Acreditam que há meninos que nunca comeram amoras? E framboesas? E maracujás? Pois é eu conheço bem os produtos da horta e do pomar e adoro batatas fritas. Isso é que às vezes é um problema. As batatas fritas e as festas dos meus colegas na escola, só aí é que me sinto um bocado um bicho estranho. Não gosto de ficar a ver os outros meninos a comer o bolo de aniversário e eu sempre à parte a comer outra coisa qualquer que é invariavelmente a mesma. Nesses dias custa muito ser Pku. Nestes dias sinto-me revoltado, porque é que não sou como os outros? Porquê?
Sou o João e sou Pku e a minha mãe aparece mais vezes na escola do que as outras Mães, é verdade. Mas isso é uma vantagem ou uma desvantagem? Às vezes parece que faz parte da escola, já andou pelo refeitório a servir os meninos todos, como se fosse uma das funcionárias, mas sem o ser de verdade. Também aparece de vez em quando na sala de aulas e senta-se nas mesas dos meninos, fala com o professor Pedro, vai na camioneta à piscina com a turma quando a D.Manuela não pode ir e conhece todos os meninos da turma e todos a tratam pelo nome. O que não impede o Professor Pedro de me põr de castigo sem intervalo quando me porto mal. Pois...
Sou o João e sou Pku e de 15 em 15 dias, logo que acordo, o meu Pai faz-me um cortezinho nos dedos para preencher um cartão com o meu sangue vermelho, que depois vai de envelope para o correio azul. Às vezes é todas as semanas e isso já não gosto nada. Sim, este é um problema, detesto fazer as análises de seringa e agulha e de vez em quando tem que ser. A minha mâe até parece que fica com os cabelos em pé, mas deve ser uma forma de dizer que gosta muito de mim.
Sou o João, sou Pku e de 3 em 3 meses vou à consulta ao hospital. mas é bem divertido, há um parque de cortiça com um escorrega e baloiços e quando está frio jogamos ao Mikado e ao jogo da Glória na sala de espera. Eu e a minha Mãe. Na consulta sou medido, pesado e a minha Mãe a Dra. Ana falam falam falam e de vez em quando meto umas colheradas na conversa e riem-se e brincam comigo.
É verdade, não gosto que a minha mãe não me deixe comer o pacote todo das castanhas assadas de rua. Não gosto de não poder comer batatas fritas as vezes que quero. Não gosto de ver as montras das pastelarias muito bonitas e não poder comer, experimentar,nem sequer provar! nenhum daqueles bolos. Não posso comer quase nada do que os outros comem e acho isso dificil de engolir. Nem nos dias de festa. Nem no Natal! Por mais que a minha Mãe me explique e repita, acho que ela fica um bocado tensa quando lhe faço estas perguntas.
Sou o João, tenho 8 anos e sou Pku. Já sei que a Pku é uma doença rara e que de vez em quando vou com a minha Mãe a uns lanches e a uns encontros onde há outros meninos com uma doença igual à minha e é divertido porque aí todos comemos as mesmas coisas e as outras Mães fazem bolos e doces diferentes dos da minha mãe e eu posso comer!
Hoje é o dia das Doenças Raras como a minha e fizemos pão de manhãzinha. pão simples, pão com azeitonas, massa para pizzas. Tive direito a uma prenda, passeio e descanso porque por acaso até estou de férias e até não parece assim tão dificil ser Pku. Principalmente porque sei que há outros meninos como eu que crescem e seguem a sua vida como todos os outros meninos.
Mãe hoje comes como eu!
Dito e feito.
Faz de conta que foi o João que escreveu. Podia ter sido! É assim que eu tento ver através dos seus belos olhos profundos e expressivos. Resiliente, irónico, forte na sua fragilidade. O meu amor é assim,
Sophia
Faz de conta que foi o João que escreveu. Podia ter sido! É assim que eu tento ver através dos seus belos olhos profundos e expressivos. Resiliente, irónico, forte na sua fragilidade. O meu amor é assim,
Sophia